domingo, julho 11, 2010

Normose, a peste do século.

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Por Sandra Regina da Luz Inácio

Neologismo criado por Jean-Yves Leloup, um dos pioneiros da psicologia transpessoal na Europa, o termo NORMOSE remete à perigosa realidade em que o hábito nocivo torna-se a norma de consenso. O resultado pode ser a doença, a destruição e a morte.

Essa palavra representa, na realidade, um conceito fundamental para a psicologia, a sociologia, a antropologia cultural e a educação, entre outras áreas. Efetivamente, a normose é uma das origens das nossas frustrações, sofrimentos e morte. Mas como se formou ela? Quais os seus contornos?

Quando todos estão de acordo em relação a uma opinião, atitude ou ação, forma-se um hábito. A grande maioria de nossos hábitos resultam de normas que adotamos de forma mais ou menos consciente, pela imitação de nossos pais e educadores ou - como diria Freud - por um processo de introjeção. Levantar, lavar o corpo, comer nas horas certas, trabalhar são hábitos que derivam de prescrições sociais bem definidas.

Essas, em geral, têm a função de preservar nosso equilíbrio físico, emocional e mental, assim como a harmonia e a sobrevivência da sociedade em que vivemos. Algumas produzem sofrimento, doenças ou mesmo morte. Entretanto, como resultam de um consenso, são adotadas pela maioria, ou mesmo por todos, pois as pessoas não têm consciência de seu caráter anormal.

Essa é uma característica patológica das regras.

Quando algumas são questionadas, por causa de suas características patológicas, pode haver dissolução e mudança de comportamentos, embora isso raramente aconteça. A mudança de atitude das pessoas em relação ao hábito de fumar é um exemplo. Fumar era considerado um símbolo de masculinidade. Quanto mais forte fosse o tabaco, mais viril e "macho" seria o homem. O cigarro significava também «status» social, riqueza e conforto. Fumar cachimbo evocava um estado de profunda reflexão.

Na medida em que foram descobertos os efeitos cancerígenos e respiratórios do fumo, começaram a aparecer nos aviões - e depois nos lugares públicos - os avisos de «proibido fumar», prática rapidamente difundida em quase todo o mundo. Surgiram as novas legislações, que obrigaram os fabricantes a alertar o público sobre os efeitos nocivos do cigarro. Felizmente, assistimos agora ao fim dessa normalidade patológica.

O exemplo do cigarro proporciona certa compreensão e a possibilidade de aprofundar o sentido desse neologismo. Inicialmente, há o fato de que era considerado "normal", o que introduz a noção de normalidade. Existia também um consenso em torno do ato de fumar, que era valorizado como sinal de masculinidade. Essa característica está explícita na propaganda de certa marca de cigarro, em que os fumantes são representados como cowboys. Além disso, fumar é um comportamento estimulado por um sistema de valores e atitudes que, no nosso caso, giram em torno da virilidade e da sensualidade.

Normose seria a doença que faz com que o indivíduo aceite comportamentos nocivos ou aja por sobre um plano ilusório de uma maneira normal. O sujeito se acostuma tanto com determinada situação que nem pensa em questioná-la. Ela passa a fazer parte do cotidiano, mesmo trazendo prejuízos significativos.

Normose é assistir a escândalos políticos como corrupção e desvios de recursos de uma maneira normal. Embora reivindicações por mudanças sejam constantes, ficamos só no discurso. Ao invés de curar o mal pela raiz, somos tentados a simplesmente desviar do problema.

Passiva, a sociedade aguarda providências das "autoridades" as quais, quem sabe, nunca chegarão.

A falta de ética dos ambiciosos e o comodismo generalizado inibe credibilidade e bom senso, restringindo a iniciativa e o trabalho criador necessário a uma sociedade próspera e equilibrada. E isto não acontece somente no meio político-social.

A normose é um mal que avassala o mundo inteiro, penetrando também em nossos lares, onde tanto somos influenciados pelas chamadas "propagandas enganosas" da mídia, como tornamo-nos vítimas de maus hábitos e modismos que denigrem cultura e valores sociais.

Num mundo repleto de superficialidades, tornou-se comum assimilar referências vazias e sem sentido. Obsessão por consumo e manutenção de "status" são algumas condutas sutilmente interiorizadas, mesmo sem significado real para nosso próprio crescimento. Adquirimos padrões duvidosos apenas porque são considerados normais.

A normose também está na sexualidade. A revolução cultural, mesmo rompendo com antigos e rígidos padrões de relacionamento, acabou por incentivar situações fúteis e passageiras.

Tentando resgatar liberdade e sensualidade, muita gente acabou por trocar intimidade e espontaneidade por indiferença e promiscuidade.

Substituímos inconscientemente nossos próprios valores, aderindo às transformações de uma maneira inerte - normal.

Bem, sei que não é fácil exercitar auto-consciência frente a tantos estímulos. Mas, com sabedoria e vontade de crescer poderemos banir a normose, caminhando equilibradamente rumo a um futuro próspero, onde o progresso seja não só o resultado de transformações urgentes e transitórias, mas sobretudo baseado em valores sólidos e conscientes. Sobre o Autor

•PhD em Administração de Empresas pela Flórida Christian University (EUA) •PhD em Psicologia Clínica pela Flórida Christian University (EUA) •Psicanalista e Diretora de Assessoria Geral da Sociedade de Psicanálise Transcendental. •Mestre em Administração de Empresas pela USP. •Especialista em Estratégias de Marketing em Turismo e Hotelaria pela USP, MBA em Gestão de Pessoas e Especialista em Informática Gerencial. •Psicanalista voluntária na Casa de Apoio à Criança Carente com Câncer e na Universidade da Terceira Idade. •Professora da FGV do Rio de Janeiro e de mais 03 universidades. •Empresária no ramo moveleiro •Responsável e Membro do Conselho Editorial da Revista Empresa Familiar. •Coordenadora do grupo de Excelência de Empresa Familiar do Conselho Regional de Administração de São Paulo - CRA. •Diretora da DS Consultoria S/S Ltda, especializada em Empresas Familiares. •Conciliadora, Mediadora e Árbitra Empresarial. •Membro do Conselho Editorial e responsável pela Revista Empresa Familiar. •Autora do livro O Perfil do Empreendedor e co-autora do livro Empresa Familiar: Conflitos e Soluções, juntamente com Domingos Ricca, Roberto Gonzalez e José Bernardo Enéas Oliveira. •Vários artigos publicados na área de Administração, Tecnologia da Informação e Psicanálise em revistas especializadas.

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