quinta-feira, dezembro 31, 2009

O Caos Prossegue

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Adriano Benayon * - 14.12.2009

O ano de 2009 termina sem ter acabado o caos nem a manipulação dos mercados financeiros. Ao contrário, ambos continuam aumentando. A lógica aponta, há muito tempo, para o colapso final do sistema imperial do dólar - cada vez menos sistema, e cada vez mais caos. Entretanto, os controladores das finanças mundiais forçam a sobrevivência desse intolerável pseudo-sistema, causando estragos cada vez maiores.

Eles se valem para isso do imenso poder de corrupção acumulado mediante os ganhos inimagináveis das manipulações financeiras, por meio das quais são criados - do nada , nos discos rígidos dos computadores dos bancos centrais, dos Tesouros e dos grandes bancos e instituições financeiras - dezenas e até centenas de trilhões de dólares, exclusivamente para servir ao poder dos concentradores.

Respingam para a economia real frações desprezíveis da avalanche de moeda e de títulos inventados nos bits da informática, fazendo definhar a estrutura produtiva e deteriorar-se as condições de vida dos habitantes do planeta.

Nesse império do absurdo, a lógica é espezinhada junto com as pessoas. O poder financeiro, mais concentrado que nunca, se tornou absolutista, pois os atuais detentores do poder dispõem de meios tecnológicos de comunicação e de moldagem das mentes, que lhes permitem exercer totalitarismo muito maior que os monarcas dos Séculos XVI e XVII e as ditaduras do Século XX.

Transgênicos

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Este é um caso exemplar da destrutividade reinante também na economia real, dita produtiva. Nela cresce o espaço dos produtos nocivos à saúde e à vida humanas, em prejuízo dos que lhes são favoráveis. Um dos exemplos mais candentes dessa escalada para liquidar a humanidade são os cereais e outros alimentos transgênicos.

No Brasil, apenas um governador, o do Paraná, tenta evitar essa calamidade, enquanto a grande maioria dos demais e o governo federal a promovem.

A Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio), criada em 2005, beneficia as transnacionais da biotecnologia com aprovações consecutivas, e sem exceção, dos pedidos de liberação de variedades transgênicas no Brasil. Entre 2005 e o final de 2009, a CTNBio terá liberado o plantio comercial de duas variedades de soja, dez de milho e seis de algodão.

A EMBRAPA é a empresa estatal de pesquisa agropecuária. Depois de ter realizado excelentes desenvolvimentos, ela ficou controlada de fato pelas transnacionais, as quais, além disso, absorveram as firmas privadas de capital nacional do setor.

As sementes transgênicas são controladas, em âmbito mundial, por transnacionais: Monsanto, Cargill, Bunge, Syngenta, Bayer, BASF e Dow AgroSciences.

A CTNBio é composta por doutores pesquisadores da EMBRAPA - que ali tem cinco conselheiros – e de universidades, como USP, UFPE, UFRJ, UFMG, UNICAMP, UNB, UFV, UFRGS, UFES, PUC-RS, UFAL, UNIFESP E UEL. Também da ESALQ/USP (Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz) de Piracicaba.

O x da questão é que a maioria absoluta dos conselheiros da CTNBio participa de projetos de pesquisa em associação com uma ou mais das transnacionais mencionadas. Isso explica porque essa Comissão aprovou, em maio deste ano, o milho transgênico da Bayer, altamente danoso. Isso se deu contra o parecer do Ministério da Agricultura e da EMBRAPA, sem que, entretanto, o governo, em defesa da segurança alimentar e da saúde pública, vetasse esse plantio.

Alguns dos efeitos destrutivos dos transgênicos são expostos por Ruy Nogueira no artigo “O sumiço das abelhas”, publicado em A Nova Democracia, junho de 2007 e por Marcos Arruda, em agosto de 2007, em “Brasil livre de transgênicos”.

Nos EUA, onde também já houve enormes danos à agricultura por causa dos transgênicos, alerta-se a respeito da extinção das abelhas e, consequentemente, da polinização, indispensável à reprodução das plantas.

Mesmo que não causasse esse terrível dano, capaz de acabar com várias espécies, inclusive a humana, o plantio dos transgênicos coloca os países que o admitem, inteiramente à mercê das transnacionais que dominam o mercado das sementes transgênicas e outras híbridas.

De fato, ficam os agricultores sem meios de obter sementes senão comprando-as do cartel mundial das transnacionais. Estas detêm total poder de impor preços e de chantagear, com a negação do fornecimento, os que não se curvem ao Império.

Não bastasse isso tudo, a dependência dos transgênicos obriga, ainda, a empregar herbicidas químicos específicos para esses plantios, como o glifossato da Monsanto, altamente danosos ao ambiente e à qualidade da terra, ademais de serem armas adicionais de extorsão, por meio do monopólio do fornecimento.

O modelo

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De perversidade semelhante à vista no exemplo acima, há, sem dúvida, mais casos em outras indústrias, os quais ilustram como os interesses nacionais e os de cada um dos brasileiros são massacrados pelo abuso de poder de grupos concentradores sediados no exterior, decorrente do modelo econômico formado no Brasil desde 1954.

Em artigos, inclusive os dois mais recentes publicados em A Nova Democracia, “País Ocupado”, em novembro, e “País saqueado”, em dezembro, mostro que o Brasil, em conseqüência desse modelo, deixa de desenvolver o magnífico potencial que lhe deveriam assegurar seus maravilhosos recursos naturais.

A principal característica do dito modelo é oferecer todo tipo de vantagens e de subsídios para as empresas transnacionais se apossarem dos mercados de bens e de serviços no País. Ora, quem controla os mercados, controla o que se vai produzir para eles, a tecnologia de produção e a que preço os produtos vão ser vendidos.

Quem manda nisso tudo, concentra os meios financeiros para controlar também os meios de comunicação, o ensino nas universidades e nas escolas, as campanhas eleitorais, a escolha dos supostos governantes e tudo mais.

Artilharia contra a cultura

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A liquidação das empresas industriais brasileiras de capital nacional, ao se consolidar o modelo que privilegia as transnacionais, inviabiliza a defesa nacional, mantendo o País inerme diante da ameaça permanente de intervenções militares. Mas outro importante meio, empregado pelo Império, para manter o Brasil dominado é a sistemática destruição de sua cultura, processo que ganhou intensidade desde a Segunda Guerra Mundial, em que o Brasil foi envolvido no início dos anos 1940, manipulado pelas potências anglo-americanas.

Isso se faz por meio da penetração de produtos fonográficos, cinematográficos, televisivos etc. destituídos de beleza e de arte, e plenos de agressão à sensibilidade auditiva e visual das pessoas, ademais de destruírem valores saudáveis. Com o empurrar incessante desses produtos durante o “entretenimento” e também nos intervalos de publicidade, conseguiram fazer habituar-se a eles dezenas de milhões de brasileiros, transformados, assim, em sujeitos passivos, capazes de tolerar qualquer tipo de violência e de desrespeito.

Além disso, o deslumbramento com o “primeiro mundo”, a adoção de seus valores utilitaristas e a adoração à riqueza material, faz que a pseudo-elite absorva em suas mentes a propaganda enganosa dos detentores do poder mundial quanto às pretensas vantagens do livre-comércio e da abertura da economia ao capital estrangeiro: em suma, da globalização. Assimilam-se também mentiras sobre as questões de poder internacionais, os motivos das guerras, das intervenções etc.

Guerra para emitir moeda internacional

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Quem acredita nessas estórias e lorotas, acredita também que o Brasil não sofreu com o colapso dos mercados financeiros mundiais, imagina que a “crise” global acabou e que não há perigo algum para nós em que o Brasil continue atrelado ao pseudo-sistema monetário do dólar e a mercados manipulados ao bel-prazer dos concentradores financeiros.

Não é apenas a pseudo-elite e o grosso de sua classe política do Brasil, telecomandada do exterior, que se deixam iludir. Muita gente nos próprios países hegemônicos e em países a eles associados também é enganada por notícias distorcidas e interpretações enviesadas.

Ao lado da pressão dos hegemônicos baseada no poder militar, isso permite entender como têm sido possíveis algumas fases de recuperação do valor do dólar, interrompendo seu longo declínio.

É o que ocorreu na semana de 7 a 12 de dezembro. O dólar, que se havia se desvalorizado em 50%, desde o início do ano, em relação ao ouro, recuperou cerca de 10% nessa semana. A manipulação pró-dólar originou-se da divulgação do desemprego nos EUA, em novembro, por ter este aumentado bem menos que nos meses anteriores. Embora a taxa oficial se mantenha em 10% (era 4,9% há dois anos), magnificou-se o aspecto positivo daquele dado, se é que contém algo positivo.

Ou seja: com a irracionalidade telecomandada, um dado sem importância pode, ainda que temporariamente sobrepujar nos mercados os fatos realmente relevantes.

Que fatos são esses? Nada mudou na realidade: o dólar está hiperinflacionado e não há como sustentar seu valor, quer haja retomada da atividade econômica, o que é irrealista, quer prossiga a depressão, o que é provável.

Os dados relevantes estão na colossal oferta potencial de dólares nos mercados: 1) moeda em poder do público nos EUA mais saldos das contas correntes e travellers checks (M1): US$ 8 trilhões; 2) o M1 + depósitos de poupança, depósitos a prazo abaixo de cem mil dólares e contas para aposentadoria (M2): US$ 10 trilhões; 3) o M2 + depósitos a prazo acima de cem mil dólares, depósitos em eurodólares, saldos em agências de bancos dos EUA no exterior, saldos em fundos de mercados financeiros (M3): quase US$ 15 trilhões.

As reservas em dólares em bancos centrais (fora o FED) são estimadas em US$ 6 trilhões. Há, também, dezenas de trilhões de dólares em contas de bancos e de fundos em todo o mundo, inclusive paraísos fiscais e cerca de US$ 300 trilhões de derivativos. A dívida federal em mãos do público chegou a US$ 7,6 trilhões em 12.11.2009, e a federal total, a US$ 12 trilhões. A dívida total (federal, estadual, local e a privada), já atingira US$ 57 trilhões em maio deste ano.

Desde 2008 o colapso financeiro levou a emissões de US$ 23 trilhões (de moeda pelo FED e de títulos e garantias pelo Tesouro dos EUA). Agora, não falta muito para estourarem novas bolhas, como a dos mercados de ações e de matérias-primas industriais, e recrudescerem as bolhas mais antigas como a dos imóveis, juntando-se os comerciais aos residenciais, e surgirem mais títulos tóxicos nos derivativos e credit default swaps .

Para cobrir isso tudo serão necessárias novas e imensas emissões de dólares, e, neste fim de ano, perdura o quadro que caracterizou 2009: os bancos guardam o dinheiro emitido para eles pelo FED, para tapar novos rombos. Afora isso, usam parte dele investindo nas bolhas.

Esse potencial de oferta, de que citei alguns indicadores, implica que ninguém mais deveria aceitar dólares nas transações internacionais. Com efeito, quem recebeu essa moeda e formou reservas com ela já teve prejuízos de grande monta, mesmo antes de o potencial de oferta do dólar ter crescido com a velocidade incrível dos últimos dois anos.

A guerra de pressões e de manipulações, movida pelos concentradores anglo-americanos contraria as leis da economia, já que eles forçam contra o interesse dos envolvidos, a existência de procura por uma moeda contaminada por sua própria proliferação.

Apesar de terem abusado indecorosamente do privilégio, gerando os acima indicados volumes de dólares, esses concentradores não se conformam em perdê-lo. Querem continuar emitindo a seu bel prazer quantidades ilimitadas de moeda capaz de comprar riquezas reais de todo tipo, governos e até “consciências” em qualquer lugar do mundo.

A guerra apontada é continuação da que foi movida contra o Iraque, quando este não quis mais dólares em troca de seu petróleo. Está na “lógica” também do cerco ao Irã. E também é guerra de extermínio, pois prolonga e agrava o caos monetário, priva as atividades produtivas de financiamento e, em consequencia, faz enraizar-se ainda mais a depressão, com desemprego abrangente, duradouro e crescente.

* Adriano Benayon é Doutor em Economia. Autor de “Globalização versus Desenvolvimento”, editora Escrituras. abenayon@brturbo.com.br

Publicado em A Nova Democracia, nº 61 – janeiro de 2010.

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