Brasil, paraíso do banditismo sindical
04.05.2011
Por ANTONIO CARLOS LACERDA
BRASILIA/BRASIL - Já foi o tempo em que ser diretor de sindicato era uma missão ousada e destemida, sem qualquer finalidade lucrativa, destinada à defesa dos interesses sociais e trabalhistas da categoria de trabalhadores que representava.
Hoje, ser um diretor sindical, respeitadas as honrosas exceções, é uma 'missão' em busca do enriquecimento ilícito e criminoso às custas do suor, a sol e chuva, dos trabalhadores que pagam, mensalmente, suas contribuições aos cofres do sindicato.
Não é a toa que no Brasil a disputa pela vitória nas eleições sindicais virou notícias nas páginas policiais da imprensa nacional. Assassinatos misteriosos e crimes insolúveis fazem parte da história sindical brasileira.
Fortunas são construídas às custas das contribuições mensais que os trabalhadores pagam ao caixa ao sindicato da sua categoria profissional e vão diretas para as contas bancárias secretas dos 'abnegados e transparentes' diretores sindicais.
O imposto sindical, um bolo tributário de quase R$ 2 bilhões, formado por um dia de trabalho/ano de toda pessoa que tem carteira assinada, alimenta um território sem lei. Os 9.046 sindicatos (diretores sindical seria a expressão mais apropriada) brasileiros que dividem esses R$ 2 Bilhões não são fiscalizados.
Criar um sindicato transformou-se em um dos mais rentáveis e seguros negócios lucrativos no Brasil. Existem sindicatos para todo tipo e interesse lucrativo. No Brasil tem sindicato só de fachada, sindicato de dissidentes devido a rachas internos e até entidades atuando como empresas de terceirização de mão de obra. Tem até Federação - que por força de lei representa sindicatos de uma determinada classe de trabalhadores - sem ter sequer um sindicato filiado.
Os dirigentes das centrais admitem que o imposto sindical é o grande atrativo e está por trás da proliferação sindical, o que transforma alguns sindicatos em verdadeiros cartórios. Ano passado, 2010, o Ministério do Trabalho teria registrado um novo sindicato a cada dia, 126 no total, o que aponta uma verdadeira indústria sindical camuflada na chamada liberdade sindical, dispositivo de lei garantido pela própria Constituição Federal.
A proliferação sindical transformou-se em uma epidemia a partir de 2008, quando o governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva decidiu formalizar as centrais sindicais cuja fatia do bolo em dinheiro que recebem é proporcional ao número de entidades sindicais que têm como suas filiadas. Ainda no governo Lula a situação tornou-se mais fácil ainda quando o presidente decidiu que as centrais sindicais não são mais obrigadas a prestar contas do gasto e destino bolo em dinheiro que recebem através do imposto sindical.
O presidente da Central Única dos Trabalhadores (CUT), Artur Henrique da Silva Santos, chegou a dizer que "Parte dos sindicatos é constituída sem representatividade, só com o objetivo de arrecadar os recursos dos trabalhadores através das taxas existentes".
Já o presidente da União Geral dos Trabalhadores (UGT) e do Sindicato dos Comerciários de São Paulo, Ricardo Patah, disse que "está havendo desmembramento de sindicatos, muitos deles artificiais e piratas. É o banditismo sindical."
Existe uma estimativa que, por ser um lucrativo 'meio de vida', mais da metade dos sindicatos existentes no Brasil tem como finalidade somente o recebimento de mensalidades pagas pelo trabalhador e a participação na divisão do bolo do imposto sindical.
Dirigir uma entidade passou a ser meio de vida de algumas pessoas, como foi a denúncia do caso de Djalma Domingos Santos, que dirige um sindicato que faz intermediação de mão de obra para empresas do agronegócio.
Os abusos foram tão ousados e flagrantes que o sindicato ficou sob investigação do Ministério Público do Trabalho. Djalma Domingos Santos também preside sindicatos de trabalhadores da movimentação de mercadorias em geral em pelo menos cinco cidades. A região Centro-Oeste é a principal fonte de renda do Sintram, presidido por Djalma Domingos dos Santos, responsável pela montagem de uma rede de sindicatos em outras cidades de Goiás, além de Mato Grosso, Tocantins, Bahia e Distrito Federal. Em Brasília, o endereço fornecido pela entidade ao governo é fictício. Somente na região de Rio Verde, Goiás, o sindicato chega a faturar R$ 1 milhão com a retenção de parte do salário dos trabalhadores.
Não se consegue acreditar como pode uma única pessoa conseguir ser presidente de tantos sindicatos ao mesmo tempo, devidamente registrados no Ministério do Trabalho. Se para dirigir um único sindicato já seria uma tarefa árdua e que requer completa dedicação, imagine dirigir vários sindicatos, como é o caso de Djalma Domingos dos Santos.
Por sua vez, o próprio governo evita qualquer ação que possa parecer interferência na atividade sindical. Autoridades do Ministério do Trabalho dizem que "Temos de observar a Constituição, que garante a liberdade sindical."
Escudada no dispositivo constitucional, a criação de sindicatos galopa no Brasil. O Ministério do Trabalho requer apenas "um mínimo de democracia" no processo de fundação de um sindicato. É preciso realizar uma assembléia, convocada em jornal de grande circulação e no Diário Oficial, para pedir a formalização do futuro sindicato. A candidatura da entidade a um registro formal, que lhe dará acesso ao imposto sindical, é submetida a uma audiência pública por 30 dias.
A checagem e conferência da documentação do futuro sindicato é apenas formal. Nenhum fiscal verifica, por exemplo, se o endereço informado existe de fato. As investigações sobre irregularidades com o dinheiro do imposto sindical são feitas pelo Ministério Público e pela Polícia Federal.
A frouxidão e complacência do governo para com os sindicatos não é recente. O banco de dados do Ministério do Trabalho sobre entidades sindicais só foi criado em 2005. Teria até havido um período, no final da década de 1990, em que os sindicatos nem eram registrados no ministério, devido à legislação ser vaga a esse respeito.
A Constituição diz que "a lei não poderá exigir autorização do Estado para a fundação de sindicato, ressalvado o registro no órgão competente, vedadas ao Poder Público a interferência e a intervenção na organização sindical." Isso não deixa claro se o órgão competente para registro sindical é o Ministério do Trabalho.
Essa ambigüidade da Constituição foi a base do veto que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva impôs ao artigo 6º da Lei 11.648, que regulamentou as centrais sindicais. O texto previa a prestação de contas do dinheiro da contribuição sindical ao Tribunal de Contas da União (TCU), mas o governo considerou o artigo inconstitucional, por representar uma interferência do Poder Público nas centrais sindicais. Posteriormente, o Congresso confirmou o veto do ex-presidente Lula.
Ao serem legalizas, as centrais sindicais passaram a disputar uma fatia de até 10% do bolo da contribuição sindical que, no ano passado, foi de R$ 81 milhões. A maior fatia, de R$ 26,8 milhões, foi destinada à CUT.
As centrais sindicais tiveram papel fundamental no apoio ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva durante o auge do escândalo do mensalão, prometendo tomar as ruas e 'incendiar' o Brasil caso prosperasse a ameaça de impeachment do então presidente.
Mas, como no Brasil os partidos e seus políticos que se dizem de oposição ao governo, na verdade, são frouxos, covardes e fisiológicos, a situação logo se acomodou, certamente por terem recebido do próprio governo um 'cala boca' ou uma 'teta para mamar'.
De 2005 a 2010, o governo pagou R$ 3,3 milhões a um sindicato de fachada que, em vez de representar os interesses dos seus associados trabalhadores, na verdade, atua como empresa de terceirização de mão de obra.
O dinheiro foi repassado pelo Ministério da Agricultura ao Sindicato dos Trabalhadores na Movimentação de Mercadorias em Geral (Sintram) de Montividiu, em Goiás.
Jornalistas que estiveram em Montividiu encontraram, no endereço que o sindicato forneceu ao governo, um pequeno imóvel alugado de dois cômodos, sem placa de identificação, ao lado de um salão de beleza.
O imposto sindical movimenta no Brasil R$ 2 bilhões por ano, um forte e veemente atrativo para se registrar um sindicato. No caso do Sintram, além de abocanhar uma parte desse dinheiro, o sindicato fecha contratos com empresas agrícolas para fornecer mão-de-obra e retém 15% do dinheiro destinado ao pagamento dos trabalhadores, prática considerada ilegal pelo Ministério Público do Trabalho.
A região Centro-Oeste é a principal fonte de renda do Sintram, presidido por Djalma Domingos dos Santos, responsável pela montagem de uma rede de sindicatos em outras cidades de Goiás, além de Mato Grosso, Tocantins, Bahia e Distrito Federal.
Em Brasília, o endereço fornecido pela entidade ao governo é fictício. Somente na região de Rio Verde, Goiás, o sindicato chega a faturar R$ 1 milhão com a retenção ilegal de parte do salário dos trabalhadores.
A unidade do Sintram em Montividiu, que recebeu os R$ 3,3 milhões do Ministério da Agricultura 2004 foi colocada como alvo de um inquérito do Ministério Público pela suspeita de aliciamento de trabalhadores nordestinos, coação, condições precárias de trabalho e fraudes trabalhistas.
A legislação sobre o setor de carregamento de mercadorias, atualizada em 2009 pelo Congresso, permite ao sindicato apenas "intermediar" a contratação dos chamados "trabalhadores avulsos", mas não prevê contratos de prestação de serviços, nem retenção compulsória de parte dos salários.
A proliferação de sindicatos no Brasil caminha a galope na contramão da tendência mundial. Enquanto nos demais países, as entidades sindicais procuram se fundir, com a finalidade de ganharem poder de barganha com os sindicatos patronais nos dissídios coletivos e nas questões judiciais em defesa dos interesses do trabalhador, aqui, no Brasil, ocorre o inverso: a fragmentação sindical, com o conseqüente enfraquecimento do poder de barganha do trabalhador com o seu empregador.
A pulverização dos sindicatos é mal vista também pelos próprios dirigentes sindicais e pelo governo. Em entrevista a um órgão da mídia impressa, sobre a pulverização de sindicatos pelo Brasil afora, Luiz Antonio de Medeiros, ex-secretário de Relações do Trabalho, disse que isso "Não é bom para a força dos trabalhadores. E, enquanto existir o imposto sindical, isso vai acontecer".
ANTONIO CARLOS LACERDA é Correspondente Internacional do PRAVDA.RU
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