A Lei Ficha Limpa conseguiu a maioria dos votos no Supremo Tribunal Federal e já pode ser considerada constitucional, segundo informações da Agência Brasil.
Se aprovada pelo Supremo, a lei, que prevê a inelegibilidade por oito anos de políticos condenados criminalmente por órgão colegiado, será válida já nas eleições deste ano.
Com o voto do ministro Ayres Britto, já são seis favoráveis à validade da lei. O ministro Antonio Dias Toffoli votou parcialmente contra e o julgamento prossegue.
Toffoli, que havia suspendido o julgamento da lei em dezembro de 2011 com um pedido de vista, defende que só deve ser inelegível o político condenado definitivamente, sem possibilidade de recurso.
Dois dos ministros, Carmem Lúcia e Luiz Fux, declararam seu apoio à lei, mas sugeriram que seja descontado do período de inelegibilidade dos políticos o tempo entre sua primeira condenação e a decisão final da Justiça sobre o caso.
De acordo com a Agência Brasil, seis ministros do STF ainda deverão se manifestar sobre a Ficha Limpa, começando por Ricardo Lewandowski, que tem uma posição favorável já expressada anteriormente.
A lei complementar 135/2010, também conhecida como lei da Ficha Limpa, nasceu da iniciativa popular e foi aprovada em maio de 2010 pelo Senado por 76 votos a zero.
Ela foi sancionada pelo ex- presidente Luiz Inácio Lula da Silva no mês seguinte, mas o STF julgou que a norma não valeria para as eleições daquele ano.
Presidente de ONG anticorrupção defende Ficha Limpa para indicações políticas
João Fellet
Da BBC Brasil em Brasília
Atualizado em 16 de março, 2012 - 06:21 (Brasília) 09:21 GMT
Em encontro com Dilma, Labelle disse que é preciso acelerar processos contra a corrupção.
Proposta pela sociedade brasileira, a Lei da Ficha Limpa representa um grande avanço na forma como o país lida com a corrupção, mas é importante estender os efeitos da legislação para indicações políticas, diz Huguette Labelle, presidente da organização Transparência Internacional.
Em entrevista à BBC Brasil durante visita a Brasília, onde se reuniu com a presidente Dilma Rousseff na última quarta-feira, Labelle afirmou ainda que o combate à corrupção exige uma aceleração dos processos judiciais e o estabelecimento de critérios meritocráticos para nomeações políticas.
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Questionada sobre recentes escândalos no futebol e sobre a renúncia do presidente da Confederação Brasileira de Futebol (CBF), Ricardo Teixeira, ela defendeu que casos de corrupção no esporte sejam levados à Justiça e que o Brasil aja com transparência na organização dos grandes eventos esportivos que acolherá nos próximos anos.
"Há uma oportunidade aqui para assegurar que a Copa do Mundo e as Olimpíadas sejam feitas de forma limpa."
Leia, a seguir, os principais trechos da entrevista.
BBC Brasil - Muitos no Brasil acham que a corrupção está aumentando; outros, que ela está mais exposta e por isso a impressão de aumento. Qual visão é mais correta?
Huguette Labelle - É muito difícil medir a corrupção, mas acho que ela está certamente mais exposta, o que é bom, porque significa que a impunidade não é tolerada. É um passo positivo.
BBC Brasil - Analistas dizem que o sistema político brasileiro, com a formação pelo governo de uma grande aliança entre partidos de ideologias distintas para apoiá-lo no Congresso, é mais vulnerável à corrupção. O problema é do sistema ou de como o governo lida com seus aliados?
Labelle - Não sou especialista no Brasil, mas acho mais provável que o problema seja como se lida com os aliados. Você pode ter um sistema limpo, ainda que mais vulnerável à corrupção, mesmo com coalizões. Muitos países no mundo têm coalizões, e não são necessariamente mais corruptos. É preciso introduzir mecanismos de controle. A transparência total também ajuda.
BBC Brasil - Há exemplos de países com sistemas semelhantes de coalizão que não são corruptos?
Labelle - Muitos países nórdicos, por exemplo, têm coalizões, e eles têm bom desempenho em níveis de percepção de corrupção. Se um sistema é mais vulnerável, deve-se criar controles, torná-lo à prova de corrupção.
BBC Brasil - Fortalecendo órgãos fiscalizadores, por exemplo?
Labelle - Primeiro, garantindo que as indicações de pessoas não sejam politizadas. Seja para o Judiciário, para funcionários experientes, para indicados a cargos executivos. Pode-se estabelecer um sistema de meritocracia para as indicações dessas pessoas, com bancas competitivas, com ampla representação de especialistas.
BBC Brasil - Muitos ministros do governo atual perderam os cargos após denúncias de corrupção, mas no Brasil geralmente os efeitos de denúncias contra políticos se encerram com a renúncia, já que raramente investigações avançam e eles são punidos na Justiça. Como levá-los a julgamento?
Labelle - É muito importante que, se houver provas suficientes de que houve um problema de fraude ou corrupção, que a polícia seja trazida imediatamente para completar a investigação e depois se vá para a Justiça. Um problema em muitos países é que leva muito tempo para chegar ao processo judicial, e o perigo é perder provas, testemunhas morrerem.
Todos os países precisam achar uma forma de reduzir o tempo que as cortes levam para lidar com qualquer caso, mas particularmente esses casos (de corrupção na política). Talvez se deva estabelecer um grupo no nível da Suprema Corte, talvez garantir que haja menos níveis de apelação. É preciso acelerar o sistema.
BBC Brasil - Muitos dizem que a corrupção é parte da cultura brasileira, já que existe não só em órgãos do Estado, mas em vários outros âmbitos da sociedade. A corrupção pode ser um traço cultural?
Labelle - Não acredito que a corrupção esteja no DNA de alguém. Mas acredito que ela possa se tornar a regra, se não for prevenida nem combatida. É por isso que, além de trabalharmos com governos, parlamentares e o setor privado, também precisamos trabalhar diretamente com as pessoas, para que entendam que, se pagarem uma propina por um serviço, ou deixarem de pagar uma taxa, estão contribuindo com a fraude, estão sendo cúmplices.
Ficha Limpa deveria valer também para indicados políticos, segundo Labelle
BBC Brasil - A propósito, o que achou da aprovação da Lei da Ficha Limpa, proposta pela sociedade civil brasileira?
Labelle - Acho que é uma lei ótima. Será muito interessante ver como funcionará na eleição deste ano. Mas acho interessante tornar essa lei também aplicável aos muitos milhares de indicados políticos, porque também se quer que eles tenham total integridade e um passado limpo.
BBC Brasil – Nesta semana, após várias denúncias de corrupção, o presidente da Confederação Brasileira de Futebol (CBF) renunciou, e, nos últimos anos, vários escândalos no futebol mundial vieram à tona. Tem acompanhado os casos?
Labelle - O mundo dos esportes toca cada comunidade no mundo. Jovens frequentemente estão envolvidos com o esporte e têm seus heróis. Portanto, se o mundo esportivo tem doping, compra do direito de sediar eventos, arranjos por resultados – e muito disso acontece –, limpar o setor esportivo é muito importante.
Quando alguém sedia eventos tão importantes como a Copa do Mundo e as Olimpíadas, é necessário ter transparência em todas as ações. Sempre há muito dinheiro gasto em infraestrutura e, onde há muito dinheiro, há muita tentação para corrupção. Acho que é possível construir um sistema transparente e de supervisão para assegurar que nada dê errado. Há uma oportunidade aqui para assegurar que a Copa do Mundo e as Olimpíadas sejam feitas de forma limpa.
BBC Brasil - Quem deveria liderar a luta contra a corrupção no mundo esportivo, uma vez que as confederações são entidades privadas?
Labelle - Cada grande organização esportiva deve definir critérios éticos e ter alguém que assegure que, se algo der errado, será detectado rápido e tratado rápido, para não deixar impunes pessoas que foram corruptas. E o sistema judicial deve agir, porque às vezes esses atos são criminosos
BBC Brasil - A luta contra a corrupção se tornou uma das principais bandeiras da sociedade não só do Brasil, mas também na maioria dos outros Brics. Na Índia, houve a mobilização para a aprovação da lei Lokpal (que criaria um órgão independente para investigar a corrupção na política), e na Rússia e na China têm havido grandes protestos contra a corrupção. O que une esses movimentos?
Labelle – Há muitos fatores diferentes no que temos visto com a Primavera Árabe, o Verão Indiano, a mobilização de pessoas em cidades como Nova York ou na Rússia, mas o denominador comum é a corrupção. As pessoas estão dizendo "chega, não vamos tolerá-la". É um chamado interessante para todos os países, porque há corrupção em todos eles, em graus diferentes.
Quando as pessoas sentem que a elite política, os poderosos, os ricos não são levados à Justiça em prazo razoável, ou nem sequer são levados à Justiça, começa a haver essas revoluções. É muito melhor prevenir isso. No Brasil acho muito interessante que a Controladoria-Geral da União esteja se organizando para que cada receita e gasto do governo sejam tornados públicos. É uma ferramenta muito poderosa para impedir a corrupção.
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